Criminal Compliance

Vivemos em uma modernização constante no que diz respeito à economia e mercado. Se torna cada vez mais difícil enxergamos mercados isolados, grupos fechados e soberania econômica. Convivemos num um mundo cada vez mais global e cada vez mais transacional, no que se refere a mobilidade econômica.

O Estado vem atuando, de maneira incisiva, na persecução de práticas de corrupção por grandes empresários e agentes da administração pública. Neste contexto, o Direito Penal há algum tempo, destina especial atenção a criminalidade econômica e atuação criminal preventiva empresarial.

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Sobretudo em tempos de Operação Lava Jato, o perfil deste “novo inimigo” vem sendo muito bem delineado, sendo o contorno deste novo alvo muito bem grifado pelo Estado, nota-se inclusive pela ótica utilizada pela mídia ao noticiar prisões de grandes empresários e políticos influentes.

Assim, em atenção a esta nova dinâmica criminal econômica, o Direito Penal, aplicado em seu viés preventivo, apresentou o Criminal Compliance.

O Criminal Compliance vem se mostrando como uma alternativa eficaz e necessária às exigências de mercado atuais. Buscando uma  otimização da atividade empresarial e uma adequação destas atividades às normas fiscais e anticorrupção hoje vigentes, este produto vem sendo buscado por diversas empresas e instituições, que buscam crescimento de mercado de forma segura e estruturar.

Programas de Compliance atuam de diversas maneiras, dentre elas: regularização fiscal, adequação da atividade empresarial às normas legais, otimização da eficiência da empresa, resguardo da credibilidade e posição de mercado do empreendimento, diagnósticos de possíveis riscos, adequação das atividades à Lei Anticorrupção, e principalmente, atua de maneira preventiva no que diz respeito à responsabilização penal de dirigentes empresariais.

Cabe ao profissional de Compliance, instruir os empregados/colaboradores a respeito de suas responsabilidades sobre as informações estratégicas, os riscos as quais este se submete e alertando-os sobre a adequada maneira de estabelecer negociações tanto com o cliente quanto com a Administração Pública.

Não importa o porte do empreendimento ou seu ramo de atuação, toda e qualquer empresa se expõe a riscos, inerentes à própria atividade empresarial e negocial, bem como seus sócios e dirigentes também podem ser afetados.

Assim sendo, a atuação preventiva é de suma importância, para empresas que pretendem expandir seu mercado de maneira segura e relacionar-se de maneira positiva com a Administração Pública.

Portanto, vê-se que o Criminal Compliance, se firma como uma área promissora e com forte representatividade no que concerne a Direito Penal Preventivo, sendo imprescindível para empresas que buscam crescimento rápido e seguro.

 

Quem perdeu o “foro privilegiado”

As novas regras do foro por prerrogativa de função

O Foro Especial por Prerrogativa de Função é uma norma jurídica que emana diretamente da Constituição Federal de 1988.

Em explicação simplificada, o “Foro Privilegiado” é uma expressão comumente utilizada para dar nome a um conjunto de regras constitucionais e infra constitucionais (entendendo aqui, informalmente, as Constituições Estaduais como normas infra constitucionais) que determinam a competência para julgamento de ações judiciais (principalmente as de natureza penal) instauradas contra determinados indivíduos, em virtude de cargos que ocupam perante a administração pública.

Ao contrário do que pode parecer (e do que acredita a maior parte da população brasileira), o Foro Especial por Prerrogativa de Função, ou Foro Privilegiado, não busca proteger ou beneficiar agentes públicos. Trata-se, em verdade, de uma tentativa de garantir a aplicação da justiça.

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A ideia por trás da regra é muito simples, e se inspira diretamente na obra de Montesquieu, sem dúvida alguma o pensador mais fundamental na fundamentação das democracias contemporâneas: “Só o poder regula o poder”.

O que se busca é evitar que um indivíduo investido em uma grande quantidade de poder público seja julgado por um indivíduo incapaz de envergar poder à altura. Em outras palavras, a ideia é evitar que um indivíduo extremamente poderoso, como por exemplo um senador da república, seja julgado por outro indivíduo muito mais frágil do que ele, muito menos poderoso, como é o caso de um juiz de primeira instância.

O poder e a influência exercidos por um senador da república são tão grandes que, certamente, seriam capazes de influenciar (ou mesmo amedrontar) um juiz comum, de maneira que justamente para garantir a imparcialidade e a proteção do julgador, estipulou-se que os detentores de grande poder público seriam julgados por juízes de poder similar.

Um juiz do Supremo Tribunal Federal carrega quantidade de poder igual ou maior da que carrega um senador, de maneira que seria muito mais difícil influenciá-lo, ou mesmo intimidá-lo, no exercício de seu ofício.

Ademais, as decisões e julgamentos em processos de indivíduos com grande influência, muitas vezes tem consequências políticas capazes de gerar grande impacto na sociedade brasileira, sendo salutar que tais decisões sejam tomadas pelos membros do judiciário considerados mais capazes e preparados para assumir tamanha responsabilidade.

Contudo, em interpretação talvez influenciada pela opinião pública, o Supremo Tribunal Federal entendeu por bem restringir e diminuir a aplicação das regras de Foro Privilegiado, e os juízes ordinários passaram a ser considerados competentes e legitimados para julgar ações que, até pouco tempo atrás, seriam julgadas, desde o início, por tribunais superiores.

Uma grande modificação foi a determinação de que crimes cometidos por autoridades administrativas antes de assumirem seus cargos não mais serão julgados de acordo com a regra de competência especial por prerrogativa de função.

Isso quer dizer que um indivíduo acusado de haver cometido crime antes de ser eleito para qualquer cargo político, ou mesmo que tenha cometido crimes ao longo do exercício de um cargo público passado,  será julgado pelo juiz de primeira instância, e não pelos julgadores selecionados para julgar ações penais contra indivíduos que ostentam o cargo para o qual foi recentemente eleito.

Por exemplo: em tese, um prefeito do Estado de Minas Gerais acusado de haver cometido um crime, de acordo com a interpretação antiga do direito, seria julgado diretamente pelos desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.

Mas, com a nova interpretação (que, diga-se de passagem, consideramos inconstitucional) esse mesmo prefeito, ainda que em exercício de suas atividades, se for acusado de haver cometido um crime antes de sagrar-se prefeito, será julgado pelo juiz de primeira instância da comarca em que for denunciado.    

Um senador da república, acusado de haver cometido crimes antes de tornar-se senador, será julgado por um juiz de primeira instância, independente de estar, no momento do processamento daquele crime, exercendo poderes de senador.

Na prática, diversas autoridades públicas (prefeitos, deputados, senadores, ministros e etc) deixarão de ser julgados por tribunais superiores, e passarão a ser julgados por seus crimes passados por meros juízes de primeira instância.

Há quem diga que a mudança de entendimento é benéfica, por acreditar que existirão mais julgamentos e condenações de agentes políticos.

Contudo, somos de opinião diametralmente contrária. Acreditamos que indivíduos extremamente poderosos passarão a ser julgados por juízes muito mais influenciáveis, e com menor capacidade de fazer frente ao poder exercido pelos réus que passarão a julgar.

Ademais, um processo que tramita perante uma vara criminal de primeira instância recebe bem menos publicidade do que aqueles que tramitam perante os tribunais superiores, o que dificulta em sobremaneira a fiscalização, por parte da sociedade, do exercício jurisdicional.

Basta imaginar que inúmeros prefeitos, deputados, senadores e ministros, oriundos de cidades pequenas, do interior dos estados brasileiros, serão julgados por juízes desconhecidos, que atuam e vivem justamente nas mesmas cidades em que aqueles agentes públicos exercem enorme influência, juízes esses que circulam invariavelmente nos mesmos círculos sociais que circulam aquelas autoridades locais.

Agentes políticos, em especial prefeitos, deputados e senadores via de regra exercem muito mais influência e poder em suas regiões do que os juízes daquela comarca, e são capazes de dificultar, ou até mesmo impossibilitar, a tramitação de processos perante o poder judiciário local.

Quem perdeu o foro privilegiado, ou foro especial por prerrogativa de função

Na realidade, nenhuma autoridade perdeu, de fato, o Foro Privilegiado. Não houve mudança constitucional, de maneira que todas aquelas autoridades políticas detentoras de Foro Especial por Prerrogativa de Função continuam abarcados pela norma.

O que mudou com o novo entendimento do Supremo Tribunal Federal foi simplesmente a competência para julgamento de ações penais relativas a crimes supostamente cometido por agentes públicos quando ainda não exerciam seus cargos políticos, ou cometidos no exercício de cargos políticos passados.

Por exemplo: um prefeito que comete crime ao longo de seu mandato vigente, continua possuindo foro especial, e será julgado diretamente pelo Tribunal de Justiça de seu Estado. Mas um prefeito acusado de haver cometido crimes antes de tornar-se prefeito será julgado pelo juiz de primeira instância.

Apesar de ainda haver alguma discussão, o entendimento majoritário dos tribunais brasileiros, em especial do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, se orienta no sentido de que um agente político, ainda que atualmente envergue cargo com foro privilegiado, mas que tenha cometido crimes no exercício de um outro cargo passado, perde seu “direito” ao foro especial, e será julgado pelo juiz de primeira instância.

Por exemplo: um deputado estadual comete crimes durante o seu mandato, no qual detém prerrogativa de foro. Findado aquele mandato, o mesmo deputado se elege prefeito, cargo que também enverga necessidade de foro especial, ou mesmo se reelege para nova legislatura como deputado estadual.

Este deputado, ainda que reeleito, ou eleito para outro cargo “beneficiado” pelo foro privilegiado, será julgado pelo juiz de primeira instância, e não pelo Tribunal de Justiça do estado.

Em outras palavras, a regra do foro privilegiado só valerá para os crimes cometidos durante o exercício daquele mandato específico, e não para crimes passados, ainda que cometidos em uma época na qual aquele mesmo indivíduo, por força de exercer outro cargo qualquer, já possuía prerrogativa de foro em virtude de função.