A proibição da responsabilidade penal objetiva no Brasil

Quando ser sócio não basta

A responsabilização penal por crimes tributários, como a sonegação fiscal, exige mais do que o simples vínculo formal do réu com a empresa investigada. No ordenamento jurídico brasileiro, não basta ser sócio ou administrador para ser condenado criminalmente. É necessário comprovar a participação consciente e voluntária na conduta delituosa.

Esse foi o entendimento firmado recentemente pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), ao julgar um caso de acusação de sonegação de Imposto Sobre Serviços (ISS). A empresária acusada foi absolvida com base na vedação à responsabilidade penal objetiva e no princípio da presunção de inocência.

A proibição da responsabilidade penal objetiva no Brasil

O caso: sonegação de ISS e acusação baseada na condição de sócia

A empresária havia sido denunciada pelo Ministério Público por supostamente cometer os crimes previstos nos artigos 1º, incisos I e II, e 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90. As condutas imputadas envolviam omissão de informações, inserção de dados inexatos em documentos fiscais e ausência de recolhimento de tributos devidos.

Apesar de o Ministério Público reconhecer que a responsabilidade pelo recolhimento dos impostos era do contador da empresa, sustentou que a empresária, na qualidade de sócia-administradora, deveria responder criminalmente.

A defesa: responsabilidade penal exige dolo

A defesa recorreu da condenação com um argumento central: a responsabilidade penal, diferentemente da administrativa, não pode ser presumida com base apenas na posição ocupada pela ré na estrutura societária. No Direito Penal, não há espaço para a chamada responsabilidade objetiva — aquela em que o agente é punido sem a devida comprovação de dolo (intenção criminosa).

Ou seja, não basta que a acusada fosse sócia da empresa. Era preciso demonstrar que ela participou ativamente da suposta fraude e que agiu com vontade consciente de suprimir ou reduzir tributos, com o objetivo de obter vantagem indevida.

A decisão do Tribunal: ausência de provas e presunção de inocência

O TJMG acatou os argumentos da defesa e absolveu a empresária. A corte reconheceu que, embora houvesse débito fiscal, não existiam provas suficientes de que a ré tivesse praticado os atos ilícitos de forma dolosa. Sem a demonstração do elemento subjetivo da conduta — o dolo —, não é possível manter a condenação criminal.

O tribunal destacou ainda que a inadimplência tributária, por si só, pode caracterizar infração administrativa, mas não é suficiente para configurar crime. A responsabilização penal exige elementos concretos, obtidos sob o crivo do contraditório, que comprovem a conduta intencional do agente.

Responsabilidade penal objetiva: incompatível com o Direito Penal Brasileiro

O direito penal é claro ao rejeitar a responsabilidade penal objetiva. A Constituição Federal garante a presunção de inocência, e os princípios da legalidade e da culpabilidade exigem a comprovação de que o acusado tenha agido com consciência e vontade de infringir a lei.

No caso em questão, o tribunal reafirmou que decisões administrativas, como aquelas resultantes de processo tributário, podem servir como base para a investigação criminal, mas não substituem as provas exigidas no processo penal. Isso porque, no âmbito penal, o ônus da prova recai inteiramente sobre o Estado, e eventuais indícios precisam ser confirmados com evidências robustas e individualizadas.


A absolvição da empresária reforça um importante limite da atuação penal no campo tributário: ninguém pode ser punido criminalmente apenas por sua posição dentro de uma empresa. A responsabilização exige mais do que presunções — exige provas claras, dolo comprovado e respeito às garantias constitucionais.

Nesse cenário, a participação de uma banca de advogados especialistas na defesa em crimes tributários é essencial para assegurar os direitos da pessoa acusada, oferecendo uma atuação técnica, estratégica e alinhada aos preceitos constitucionais, o que pode ser determinante para a garantia de um processo justo e equilibrado.

Saiba mais: Apelação Criminal 1.0000.24.332312-8/001