Pandemia pelo novo coronavírus e as mensalidades escolares

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A pandemia da COVID-19 trouxe diversos impactos na economia e nas relações jurídicas de trato continuado previamente estabelecidas. Escolas e universidades particulares suspenderam aulas, anteciparam férias ou aderiram a modelos de ensino a distância. Diante desta alteração objetiva nas condições da prestação, emerge a pergunta: como fica a cobrança das mensalidades? Deve haver redução no valor?

Não obstante o ensino seja, sob o ponto de vista civilizatório, muito mais do que um mero serviço, a relação contratual entre o aluno e a escola deve ser lida sob a ótica do direito do consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor determina que consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Fornecedor, por sua vez, é pessoa física ou jurídica que desenvolve atividade de produção, distribuição, comercialização de produtos ou prestação de serviços. Este diploma legal rege, portanto, os contratos educacionais.

A Secretaria Nacional do Consumidor expediu a nota técnica 14/2020/CGEMM/DPDC/SENACOM/MJ, respondendo à solicitação formulado pelo PROCON/SP sobre o tema. O órgão recomendou que “Diante do contexto imprevisível que todas as relações de consumo estão enfrentando em razão da COVID-19 (coronavírus), a Senacon, por meio do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor – DPDC recomenda que consumidores evitem o pedido de desconto de mensalidades a fim de não causar um desarranjo nas escolas que já fizeram sua programação anual, o que poderia até impactar o pagamento de salário de professores, aluguel, entre outros”.

Por outro lado, o Programa Estadual de proteção e Defesa do Consumidor (PROCON-MG), vinculado ao Ministério Público de Minas Gerais, expediu a Nota Técnica 01/2020, onde foi deliberada a concessão pelas instituições privadas de educação básica a concessão de desconto mínimo de 29,03% no valor da mensalidade de março, o envio de propostas de revisão contratual pelas escolas, a suspensão do contrato de educação infantil, dentre outras medidas.

Certo é que, do ponto de vista jurídico, existem argumentos suficientes para ensejar a revisão contratual.

Em primeiro lugar, o Código de Defesa do Consumidor dispõe ser direito básico do consumidor a possibilidade de modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas (art. 6, V).

Um contrato educacional consiste em uma prestação bilateral. Incumbe à instituição de ensino prestar o serviço educacional e ao contratante efetuar um pagamento mensal. Diante do fechamento dos estabelecimentos físicos, pode-se argumentar significativa redução dos gastos da escola, pois aluguel e salários podem ser renegociados, além de os gastos com a manutenção do espaço serem reduzidos.

O artigo 884 do Código Civil (aplicável também a esta relação jurídica de direito privado) determina que aquele que sem justa causa se enriquecer à custa de outrem será obrigado a restituir o indevidamente auferido. Ainda, a restituição também é devida quando a causa que justifique o enriquecimento deixe de existir.

Interpretando os dispositivos legais mencionados, é possível concluir pela possibilidade jurídica de revisão das mensalidades escolares diante da alteração da situação fática gerada pela pandemia. O diálogo e negociação diretamente com as respectivas instituições antes da adoção de medidas judiciais é recomendável e pode gerar resultados satisfatórios.

Vale ressaltar, por fim, que inadimplência da mensalidade não enseja expulsão do aluno ou qualquer tipo de tratamento vexatório, mas pode implicar o indeferimento da matrícula no ano letivo subsequente.